Dia 8 de agosto!!

Acordei e agradeci pelo meu organismo já estar tão bem aclimatado. Não tinha nenhuma dificuldade para acordar mais cedo que o esperado. As 6hs da manhã já estava desperto, e arrumando os equipamentos.

Pelo menos comigo, um sinal claro da aclimatação ocorre quando minhas idas ao banheiro funcionam como um relógio. E era o caso! Por volta das 6:15, encarei o frio e fui até a latrina. Na volta, me acabei de tanto rir, quando encontrei as roupas de banho do Gilmar e da Alessandra do lado de fora da barraca deles. Com o frio e a geada da madrugada, estavam brancos e parecendo uma pedra!!

Quando o Diogenes e Michel nos chamaram para o chá madrugador, eu já estava “listo” para começar o dia! O café da manhã como sempre, foi muito animado. Hoje seria o dia de superar o maior passo da trilha, com 5000m de altitude. Por isso, embora todos se sentissem bem, havia uma certa preocupação no ar!

Como sempre, por volta das 8hs começamos a caminhar. O fato do nosso acampamento ser mais afastado dos demais acabou se mostrando uma vantagem, pois economizamos um bom trecho de subida. A trilha mesclava trechos planos e subidas fortes, mas todo o grupo mantinha um bom ritmo. Durante uma das subidas, a Alê começou a reclamar de dores no ciático. Por precaução, sugerimos que ela fizesse esse trecho a cavalo.

Depois de uma curva acentuada, avistamos outros grupos no topo do passo. Mesmo sem perceber, isso trouxe para o grupo uma dose extra de ânimo. E por volta das 10:30hs, chegamos ao Paso Punta Cuyoc, tendo um visual incrível da Cordilheira Huayhuash. Fizemos uma parada mais longa, e tiramos muitas fotos.

Embora a vista fosse magnífica, tínhamos que voltar a caminhar. E como a máxima “tudo que sobe, tem que descer” é verdadeira, logo de cara encaramos uma descida muito forte, que exigiu bastante das pernas. Mesmo descendo rápido, era preciso pisar com cuidado, pois haviam muitas pedras soltas. Ao final dessa descida, aproveitamos para fazer nosso almoço, praticamente aos pés do Nevado Cuyoc.

O tempo começou a fechar, e nos apressamos para voltar a caminhar. A trilha ficava mais tranquila, pois agora só teríamos que atravessar um longo vale. Durante esse trecho, voltou a nevar, bem de leve.

Depois de aproximadamente 2 horas de caminhada, avistamos nosso acampamento no final do vale. E precisamente às 14hs, chegamos a Guanacpatay, que ficava a 4300m de altitude. Como chegamos cedo, tivemos toda a tarde para descansar.


A noite, durante o jantar, ficamos sabendo através do Diogenes que no povoado de Huayllapa havia um telefone rural. Ficamos animados com a possibilidade de falar com nossos familiares, ainda mais porque no dia seguinte seria o Dia do Pais.

O Diogenes aproveitou para sugerir uma alteração no nosso roteiro. De acordo com a programação original, deveríamos pernoitar em Huayllapa. Mas Diogenes diz não gostar do local e prefere andar um pouco mais, subindo até o acampamento seguinte. Teríamos a grande vantagem de caminhar bem menos no dia que antecederia à subida ao Diablo Mudo. Diante de tão forte argumento, todos concordaram com a sugestão do nosso guia.

Assim que terminou o jantar, ainda fiquei um bom tempo apreciando a noite estrelada de Huayhuash. E fui descansar com uma confusão de sentimentos: dúvidas sobre minhas condições físicas para subir o Diablo Mudo, saudade dos familiares e amigos, mas acima de tudo, uma grande felicidade por estar em um lugar tão fascinante!



Dia 7 de agosto!!
Religiosamente às 6h30 fomos acordados para o chá madrugador.
Depois de dois dias bem difíceis, confesso que acordei mais animado com a perspectiva de ter um dia mais tranquilo, conforme comentado pelo Diogenes. Outra coisa que nos animava era a expectativa de conhecer as águas termais de Atuscancha.
Tomamos um café da manhã reforçado e bastante descontraído, pois a presença do Luis sempre nos garantia boas risadas.
Aos poucos íamos nos acostumando com o ritmo da caminhada e também como as coisas aconteciam no acampamento. Nosso “relógio biológico” começava a se ambientar com o fuso horário, e o nosso corpo, cada vez mais aclimatado, sentia cada vez menos o desconforto da altitude e as dificuldades de uma trilha tão exigente.
No horário estabelecido, já estávamos caminhando novamente. Por cerca de duas horas, subimos tranquilamente pela trilha, ladeando bonitas lagunas. A subida era bastante longa, mas suave. E, praticamente sem perceber, chegamos às 10h30 ao topo do passo de Portachuelo (4750m de altitude).
Fizemos uma rápida pausa, onde aproveitei para tirar muitas fotos. Ao fundo do vale, já podíamos avistar a laguna Viconga, que era o nosso próximo objetivo. Para alcançá-lo, teríamos uma longa descida. A trilha era bem larga e não trazia nenhuma dificuldade. Com isso, podíamos andar todos juntos, conversando animadamente!
Às 12h em ponto, bem próximos da laguna, paramos para o nosso almoço. Perto dali, haviam algumas casas bem simples, e as crianças que lá moravam vieram correndo ao nosso encontro. Primeiro nos pedem “plata”, o que negamos. Depois pedem doces e balas... Em nosso “box lunch” sempre tinham algumas balas, que agora eu desconfio que estavam ali justamente com esse propósito.

Depois de almoçar e descansar um pouco, recomeçamos a caminhada. Começamos a contornar a laguna Viconga, e descobrimos que ela era bem maior do que parecia. Um pouco distante, numa das margens da laguna, aparecia o Nevado Viconga.
Conforme voltamos a subir, começou a nevar bem fraquinho. Era a primeira vez que víamos neve na trilha. Logo chegamos ao topo do vale, onde havia mais um pedágio para pagar. Acertamos tudo com os moradores, e voltamos a descer um curto trecho. A neve começava a cair cada vez mais forte.
Nosso acampamento, ficava mais distante do que os outros. Para chegar até ele, tivemos que margear um longo canal de água. A mureta por onde seguíamos era bastante estreita e perigosa. Alguns trechos eram expostos, e o cavalo teve que passar por um desvio. Alguns acharam mais seguro seguir o cavalo!

As 13h30, debaixo de bastante neve, chegamos ao acampamento Viconga, instalado a 4400m de altitude. Rapidamente, fomos para as barracas descansar um pouco e esperar que a nevasca parasse.
Logo percebemos outra característica do lugar. O tempo mudava com extrema rapidez. O sol voltou a brilhar, e decidimos ir até as águas termais. Andamos mais ou menos uns 25 minutos até chegar nas piscinas. Os tickets que recebemos no último pedágio eram o “passe” para entrarmos sem pagar.
As fontes de Atuscancha eram formadas por duas piscinas, com a água aquecida a 50º. A menor delas, permitia o uso de sabão e shampoo. O tempo já estava bem mais frio, e depois da dificuldade de tirar a roupa, todos aproveitaram bastante a água quente. E, enquanto estávamos curtindo as piscinas, voltou a nevar, bem fraquinho. A situação era no mínimo, curiosa.
A tarde ia chegando ao fim, e precisávamos voltar ao acampamento. Encarar o frio depois da água quente, foi outra dificuldade. Secos e com roupas quentes, encaramos a trilha de volta. Para subir tudo, levamos meia hora.

Revigorado com um banho de verdade, voltei para a barraca e aproveitei para dar uma geral nos equipamentos. Nem percebi quando a noite caiu e nos chamaram para o jantar.
Depois do jantar, saindo da barraca refeitório, percebi rapidamente que teríamos uma noite muito fria. Me enfiei no saco de dormir, e ainda tive tempo de rememorar os acontecimentos dessa caminhada até então. As bolhas me incomodavam um pouco e ainda teríamos mais 3 dias de trilha antes da subida ao Diablo Mudo.
A dúvida se conseguiria ou não subir a montanha me incomodava bastante e não saía da minha cabeça. Mas vencido pelo cansaço, não demorei a dormir.





Dia 6 de agosto!!
Embora estivesse muito cansado pelo esforço do dia anterior, foi uma noite difícil, com um sono “cortado”. Já estava completamente desperto quando o Diogenes nos chamou para tomar o “té madrugador”.
Assim que começo a tomar o chá, o Rafael me diz que iria abandonar o trekking, pois sua noite também foi difícil e ele não estava se sentindo bem!! Eu achava que estava preparado para ouvir essa decisão, mas sempre é muito complicado ver um amigo forçado a abandonar algo que planejou com tanto afinco por quase 1 ano.
Terminamos de arrumar os equipamentos silenciosamente, deixamos tudo fora da barraca e seguimos para o café da manha. O Rafael conversou com o Diogenes sobre sua decisão, e este logo começou a preparar tudo. Mostrou para ele o trajeto a ser feito, conseguiu mais um cavalo e destacou o Severo para acompanhá-lo a cavalo até o povoado de Queropalca. De lá, o Rafael deveria pegar transporte coletivo até chegar a Huaraz.
O Luis, tentava quebrar esse momento triste dando dicas sobre o que o Rafa poderia fazer em Huaraz. Uma das dicas era fazer uma ascensão solo ao Huascaran... :)
Logo depois do café, nos despedimos do Rafael com muita tristeza e preocupação. Para ele, começava outra aventura.
Nesse dia, especialmente, não poderíamos contar com o cavalo de emergência, pois a trilha em alguns trechos era muito estreita e inclinada. O cavalo seguiria com as mulas e os arrieros por uma antiga trilha.
Ainda no acampamento, fizemos o pagamento do pedágio. As 8hs em ponto, começamos a caminhar. Logo após deixar o acampamento, cruzando uma ponte, já havia um outro ponto de pedágio.
As feias nuvens que cobriam toda a laguna Carhuacocha haviam sumido, deixando a mostra os colossos nevados do Yerupaja, Yerupaja Chico e Jirishanca. A trilha vai contornando toda a laguna, com um visual espetacular.
Logo a trilha começava a subir e abandonamos a laguna. Os maciços nevados nos acompanhavam o tempo todo. Cada um mais fantástico que o outro. Eu não parava de tirar fotos!!!
A trilha voltou a ficar plana, e nos aproximávamos das três lagunas. Por volta das 10:30, o Diogenes nos chamou para subir um pequeno elevado para vermos mais de perto uma das lagunas. Ela estava praticamente congelada. Ficamos praticamente meia hora observando as lagunas, as montanhas e as avalanches que vez ou outra insistiam em romper o silêncio.
Voltamos a caminhar. Agora começaríamos a subir o passo Siula (com 4850m). A subida é traiçoeira, com muitos trechos escorregadios e bem íngremes. A Cristina puxava a fila e todos seguíamos no seu ritmo, o que naquelas circunstâncias, não era nada ruim.
Conforme subíamos, o visual das três lagunas ia ficando mais fantástico. As câmeras fotográficas trabalhavam sempre que fazíamos uma pausa. Depois de 1 hora e meia de subida, a trilha fazia uma longa curva para a esquerda e entrava num (enganador) trecho plano. Nós olhávamos para a frente e víamos uma verdadeira parede com encostas repletas de cascalho e areia. Com certeza não seria por ali que iríamos passar. Mas era!!!

Fomos subindo lentamente. Um passo em falso, e certamente sofreríamos um grande tombo. O ar faltava para todos. Numa das pausas, vi uma das cenas mais impressionantes do trekking. A Cristina, que já havia entregue sua mochila para o Michel carregar, estava totalmente sem fôlego e muito cansada. O Diogenes, que deve medir 1,60 no máximo, simplesmente colocou a Cristina em seus ombros e começou a subir aquele trecho inclinado. Sem dúvida, ele se mostrou um guia muito forte.
Finalmente, as 13:30 chegamos ao topo do passo Siula. Descansamos bastante e aproveitamos para almoçar. Tínhamos vencido um dos passos mais temidos da trilha e obviamente, todos estavam muito cansados. Segundo o Diogenes, até uns 5 ou 6 anos atrás, o passo Siula não era usado, mas sim a trilha que estava sendo usada pelas mulas e pelo cavalo.
Como ventava muito e começamos a sentir frio, não demoramos a descer a longa trilha até o acampamento Huayhuash, que ficava a 4300m de altitude. A descida é bastante forte, mas consegui andar bem rápido para acompanhar o Diogenes.
As 16hs, chegamos ao acampamento. Para minha tristeza, vejo que iria começar a sofrer com bolhas durante a caminhada. Uma ou outra já começavam a me incomodar.
Dei uma geral nos equipamentos, e descansei um bocado. Acho que acabei cochilando, pois levantei meio “sonado” com muito barulho vindo do lado de fora. Quando abri a barraca, vi os arrieros e guias batendo uma bolinha num campo improvisado. Fala sério! Jogar futebol a 4300m de altitude, realmente não é para qualquer um. Me recolhi à barraca novamente, antes que eles resolvessem me convocar para um amistoso Peru X Brasil.
Logo a noite caiu sobre o acampamento e fomos chamados para o jantar. Conversamos, comemos, conversamos, rimos, contamos piadas para ajudar a passar o tempo. Do lado de fora, um frio tenebroso. Antes de irmos dormir, Diogenes nos animou um pouco, dizendo “amanhã a trilha será mais tranquila".
A medida que todos retornavam às suas barracas, o silêncio voltava a reinar em Huayhuash...

A turma se preparando para encarar o frio!

Dia 5 de agosto!! Hora de começar a caminhar...
As 6:30 pontualmente estavam nos chamando para tomar o “té madrugador”. Antes do café, tínhamos que colocar os equipos que não seriam usados durante o dia na mochila cargueira, que seguiria com as mulas. Só ficaria na mochila menor o básico.
Enquanto eu arrumava minha mochila, o Rafael comentava que pouco tinha dormido por causa de um desarranjo intestinal que o obrigou a ir várias vezes à latrina enfrentando o frio da madrugada. Ele também havia vomitado bastante e disse que ainda não se sentia aclimatado. Era a primeira vez que ele estava nessa altitude (Cuartelhuain estava a 4100m), e o seu corpo estava reagindo e forçando a aclimatação.

Eu já não estava normal quando deixamos Huaraz. Na época eu imaginei que o motivo do meu "desarranjo" intestinal seria a ansiedade que estava experimentando e que tudo ficaria bem tão logo a jornada começasse.
A noite, já no acampamento, pouco depois de me acomodar no saco de dormir, comecei a sentir os primeiros enjoos enquanto resistia a possibilidade de fazer uma visita à latrina. Não resisti. Vesti as várias camadas de roupa para me proteger do frio e fui ao "banheiro". Eu estava com diarréia e, durante a madrugada, fiz mais duas visitas à latrina. Na última, já acostumado ao frio e cansado de trocar de roupa e entrar e sair do saco de dormir toda hora, fiquei um bom tempo sozinho, observando o acampamento a distância. De volta ao saco de dormir, cansado demais para sair mais uma vez, passei a cabeça pela entrada da barraca e vomitei ali mesmo.


Cada pessoa se aclimata em um tempo diferente. No meu caso, o caminhada à Laguna Churup, no primeiro dia, foi suficiente para colocar tudo nos eixos.
Outro complicador era o frio. Certamente, a sensação térmica no acampamento era de uns 5 graus. Lutando contra o frio e a ansiedade, as 7hs eu já estava com minhas mochilas arrumadas e fora da barraca. O restante da turma chegou logo depois.
Enquanto tomávamos café, os arrieros já pegavam nossas mochilas e começavam a preparar as mulas para a caminhada. Tão logo deixássemos o acampamento, eles desmontavam tudo e nos seguiam.
Segundo Diogenes, o ideal era que as 7:30 nós já estivéssemos caminhando, pois o dia seria muito duro, com dois “pasos” para atravessar. Enquanto todos se preparavam, sentia os dedos dos meus pés doendo de tanto frio.
Infelizmente, acabamos nos atrasando um pouco, e só deixamos o acampamento as 8hs, em direção ao passo de Cacananpunta (4700m de altitude). A subida era bem longa e durante cerca de 1 hora caminhamos na sombra, com o frio ainda nos castigando.
Por volta das 9:15, fizemos uma parada. Aproveitei para tirar um dos casacos, pois o sol já aparecia. A preocupação do Diogenes era com o Rafael, que vinha subindo lento, acompanhado apenas pelo Michel, o guia auxiliar.

Mal dormi aquela noite. Os efeitos da altitude foram muito cruéis comigo. De manhã, a primeira coisa que fiz após o chá foi outra visita à latrina.
Esvaziamos as barracas, fizemos o desjejum e retornei para a latrina. Quando saí, todos já estavam longe. Cerca de 200m. Tive que acelerar para tentar alcançá-los e acho que forcei demais logo no início. O meu fôlego acabou rapidamente e eu comecei a caminhar com muita lentidão.

Enquanto esperávamos o Rafael, curtirmos um pouco o sol de Huayhuash. Do ponto onde estávamos, podíamos ver a movimentação dos arrieros no acampamento, quase prontos para começar a subir também.

Gilmar, eu, Alê, Luiz, Cristina, María e Diogenes

Assim que o Rafael chegou, comentou que estava sem fôlego. Assim que ele se recuperou, voltamos a caminhar. Depois de mais um trecho, quando os arrieros e as mulas já haviam nos ultrapassado, Diogenes sugeriu que o Rafael usasse o cavalo, pois ainda havia uma forte subida e havia a preocupação com o horário de chegada no acampamento. Diante desse último argumento, o Rafael aceitou usar o cavalo.

Para não estragar os planos da equipe eu aceitei continuar a cavalo, o que aumentou a adrenalina porque o bicho foi subindo o passo pulando de uma pedra para outra, sempre se equilibrando à beira do abismo.

Por volta das 10:50 finalmente chegamos ao primeiro passo. Fizemos uma rápida pausa para descansar e tirar algumas fotos, e logo começamos a descer. Eu estava me sentindo bem, embora minhas pernas doessem um bocado por conta das fortes câimbras que tive na laguna Churup.
Seguimos por um trecho mais ou menos plano, por cerca de 1 hora e meia. Próximo de um acampamento intermediário, fizemos uma pausa para o almoço.

Após descansar no alto do passo começamos a descer e me senti muito bem. Andei em um ritmo forte durante mais de 2 horas e fiquei feliz porque entendi que estava tendo progresso na aclimatação.

Meia hora depois, voltamos a caminhar sabendo que logo começaria mais uma subida. A esperança era que não fosse tão dura como a primeira. O lado bom é que a paisagem à nossa volta compensava todo o esforço!!
Chegamos num ponto onde havia a necessidade de fazer o pagamento de mais um “pedágio”. Logo depois desse ponto, a trilha voltava a subir, muito forte. Fui subindo devagar, me sentindo “pesado” e cansado, e para me motivar, ia mentalizando pequenos objetivos, tais como: “vou chegar naquela pedra”, “agora até aquele trecho plano”, etc.
Em determinado momento olhei para trás, e vi Gilmar e Alessandra começando a subir e o Rafael um pouco mais atrás, ainda bem lento. Continuei subindo, e logo me juntei ao Luis, Cristina, Maria e Alberto. Assim que parei para descansar, vomitei. Fiquei muito preocupado, mas tentei tirar os medos da cabeça e voltei a caminhar bem devagar.

O visual fantástico da trilha...

Para minha surpresa, aos poucos fui me sentindo cada vez melhor, e passei a caminhar forte. Logo o Gilmar, e depois a Alessandra, se juntaram a mim, e às 16hs nós chegamos no passo de Punta Carhuac (4650m). Esperamos o restante da turma chegar e ficamos sabendo que o Rafael voltou a usar o cavalo na subida, pois estava se sentindo muito mal.

Após almoçarmos, voltamos a caminhar e mesmo no plano senti dificuldade. Quando começamos a subir o segundo passo pedi ao Michel para ir no cavalo que passei a chamar de Imperador. Continuamos andando e ele correu na frente para buscar o cavalo. Não fiquei muito tempo com o Imperador porque a Cristina também não estava bem e logo o cedi à ela.

Após uma rápida pausa para descanso, começamos mais uma longa descida até o acampamento. Segundo o Diogenes, já estávamos muito atrasados. Durante todo o trajeto da descida, procurávamos incentivar o Rafael, que só pensava em descansar. Ele perdeu até a vontade de fotografar...
As 17:30 chegamos no mirante da laguna Carhuacocha. A tonalidade da água aos pés dos nevados realmente era uma visão fantástica e animadora. Não nos demoramos, pois começava a escurecer.
Eu estava muito cansado e não via a hora de chegar ao acampamento. Para nossa decepção, ele era o mais distante da laguna e só cheguei lá as 18hs. O Rafael chegou uns 15 minutos depois e foi direto dormir.

Caminhei com Fábio, Gilmar e Alessandra da quebrada Waya até o mirante da Carhuacocha. A partir dali fui sozinho, uns 15 minutos atrás do grupo.
Cheguei ao acampamento muito debilitado, com o tipo de sensação que se tem quando se está com febre.

Como já era tarde, logo nos chamaram para jantar, mas o Rafa disse que não estava sentindo fome. Foi a Alessandra que o forçou a tomar um pouco de sopa e comer algo. Durante o jantar eu conversei com o Diogenes sobre a situação do nosso amigo. Ele comentou que era totalmente viável fazer todo o trekking a cavalo e que também que existia uma “rota de fuga” do trekking, passando pelo povoado de Queropalca, e de lá retornar para Huaraz.
Assim que voltei para a barraca, comentei sobre essas possibilidades com o Rafael. Ele tentaria descansar e ver como acordaria na manhã seguinte. Sem dúvida, a decisão final teria que ser dele.

Não havia apetite nem sono mesmo assim comi um pouco de sopa forçado pela Alessandra e tentei dormir.

Diante dessa situação preocupante e inesperada, o grupo foi descansar. Com certeza foi um dia bastante duro. Caminhamos uns 20 quilômetros, atravessando dois passos bem complicados. Logo em nosso primeiro dia de caminhada, passamos por um difícil teste.
O dia seguinte seria um dos mais bonitos de toda a trilha, e essa era a nossa motivação quando fomos dormir.

Visual das montanhas no caminho para Huayhuash

Dia 4 de agosto!! Finalmente havia chegado o dia!
Acordamos cedo, tomamos um café reforçado, terminamos de arrumar os equipamentos e na hora marcada estávamos todos “listos” para começar a tão sonhada aventura.
Para nossa sorte, praticamente em cima da hora, mais 2 casais foram agrupados em nossa expedição. Isso fez com que nós ganhássemos um “upgrade” no pacote acordado com a agência de trekking. Nós iríamos usar o transporte público, e por conta disso teríamos que madrugar para pegar o ônibus. Como o grupo aumentou, nosso transporte passou a ser privado, e teríamos também um guia auxiliar e um cavalo de emergência durante todo o trajeto. Outra grande vantagem que ganhamos foi evitar um longo trecho de caminhada pela estrada, bastante cansativo. A van nos deixaria no primeiro acampamento de Huayhuash.
Assim, não nos importamos muito quando o Scheler – o dono da agência – nos ligou dizendo que iria atrasar um pouco.
As 9hs, a van veio nos buscar no hotel. Em seguida, fomos apresentados aos casais Luis e Cristina, escritores de BH e Alberto e Maria, espanhóis de Madrid. Também conhecemos o nosso guia Diogenes, que iria nos acompanhar nos próximos 10 dias. Com todos embarcados, pegamos a estrada em direção a Huayhuash.
Após uma rápida pausa na estrada para esticar as pernas, chegamos na cidade de Chiquian em tempo para almoçar. Chiquian é uma cidade pequena, de ruas estreitas, e conhecida pelos locais como “espejito del cielo” (espelho do céu).
Depois do almoço, seguimos por uma estrada de terra bastante estreita, em direção ao povoado do Llamac. A partir dessa localidade, as comunidades campesinas cobram pequenos valores dos trekkers. São valores que oscilam entre 15 e 30 soles (algo em torno de 10 a 20 reais) por pessoa. Eles alegam que esse pagamento é usado para garantir a segurança dos caminhantes. Reza a lenda que Huayhuash foi, num passado não muito distante, um refúgio dos guerrilheiros do Sendero Luminoso.
Depois de um bom tempo sacolejando dentro da van, finalmente chegamos ao acampamento de Cuartelhuain. Lá já estavam outras expedições, devidamente acomodadas. Estávamos radiantes com a visão dos primeiros picos nevados, o Rondoy e o Ninashanca. Fizemos um reconhecimento das cercanias do acampamento e tivemos inúmeras fotos.


Antes de se despedir, o Scheler nos apresentou toda a equipe, que consistia do cozinheiro Cirilo, dos arrieiros Willy, Severo e Isaak, do guia auxiliar Michel, além do Diogenes. Também ficamos sabendo que a nossa expedição teria um total de 14 burros para carregar todos os equipamentos, provisões, etc. Depois de feitas todas as apresentações, o Scheler se despediu, deixando seus votos de boa sorte e bom proveito.
Tivemos bastante tempo para começar a acostumar com o clima do acampamento e entender seu funcionamento. Antes que começasse a escurecer, Diogenes nos chamou para um rápido lanche. Nos chamou a atenção a qualidade da comida, e o cuidado com que tudo era feito.
Esses momentos na barraca refeitório eram especiais porque serviam para integrar todos os participantes do trekking, e também propiciavam momentos de muito riso com a sessão de piadas. O Alberto já brincava com o Rafael dizendo que estava fazendo um curso “fast-food” de português.
Logo depois de escurecer, o frio chegou com muita força. Por volta das 19hs, fomos convidados para o jantar. O difícil era sair da barraca com o tanto de frio que fazia do lado de fora. Mas o jantar compensava o sacrifício. Além disso, aproveitamos para conversar com o Diogenes e, ávidos por saber mais da trilha, procuramos absorver o maior número de detalhes. Estávamos todos muito ansiosos para começar a caminhar de verdade! O Diogenes nos chamou a atenção para o primeiro dia, que seria uma grande pedreira.
Como é praxe nesse tipo de expedição, logo nos retiramos para as barracas, para descansar e preparar tudo para o dia seguinte. Diogenes passou as instruções, informando que as 6:30hs seríamos chamados para o chá “madrugador” e que até as 7hs já deveríamos estar prontos, com todo o equipamento fora da barraca.
Em pouco tempo, a ansiedade que todos compartilhavam cedeu espaço para o cansaço e o acampamento se cobriu de silêncio.
Finalmente estávamos em Huayhuash, o destino tão sonhado!!! Agora nos restava percorrer seus caminhos e desvendar seus segredos.

O intuito do blog é também servir como um veículo de informação para todos que o visitam. Achei que seria legal compartilhar com vocês alguns princípios que devem ser adotados por todos que pretendem frequentar ambientes naturais. Espero que gostem!!!
1 - Planejamento é fundamental
- Antes de visitar qualquer área, procure entrar em contato com a administração para conhecer o regulamento e obter informações sobre as restrições existentes.
- Informe-se sobre as condições climáticas da região a ser visitada e consulte a previsão do tempo antes de qualquer atividade em ambientes naturais.
- Procure viajar em grupos pequenos, de até 10 pessoas. Grupos menores se harmonizam melhor com a natureza e causam menos impacto.
- Sempre que possível, evite viajar para áreas muito concorridas durante feriados prolongados e férias.
- Certifique-se de que você possui uma forma de acondicionar seu lixo (sacos plásticos), para sempre trazê-lo de volta.
- Escolha as atividades que você vai realizar de acordo com o seu condicionamento físico e sua experiência em ambientes naturais.
2 - Você é responsável por sua segurança
- Uma operação de salvamento em ambientes naturais é cara e complexa, podendo levar dias e causar grandes danos ao ambiente. Portanto, em primeiro lugar, não se arrisque sem necessidade.
- Calcule o tempo que passará viajando e deixe um roteiro de viagem detalhado com alguém de confiança, com instruções para acionar o resgate, se necessário.
- Avise a administração da área que você está visitando sobre: sua experiência, o tamanho do grupo, o equipamento utilizado, o roteiro e a data esperada de retorno. Estas informações facilitarão o seu resgate em caso de acidente.
- Aprenda técnicas básicas de segurança, como navegação (como usar um mapa e uma bússola) e primeiros socorros. Para tanto, procure os clubes excursionistas da sua cidade, escolas de escalada, etc. Em geral, todos possuem cursos básicos que ajudarão nessas situações.
- Tenha certeza de que você dispõe do equipamento apropriado para cada situação e que saiba utilizá-lo. Acidentes e agressões à natureza em grande parte são causados por improvisações e uso inadequado de equipamentos. Leve sempre lanterna, agasalho, capa de chuva e um estojo de primeiros socorros, alimento e água, mesmo em atividades com apenas um dia ou poucas horas de duração.
- Caso você não tenha experiência em atividades recreativas em ambientes naturais, entre em contato com centros excursionistas, empresas de ecoturismo ou condutores de visitantes para contratar um guia. Visitantes inexperientes podem causar impactos sem perceber e correr riscos desnecessários.
3 - Cuide das trilhas e dos locais de acampamento
- Mantenha-se apenas nas trilhas pré-determinadas – em hipótese alguma use atalhos que cortem caminhos. Os atalhos só favorecem a erosão e a destruição das raízes e plantas inteiras.
- Mantenha-se na trilha mesmo se ela estiver molhada, lamacenta ou escorregadia. A dificuldade de uma trilha faz parte do desafio de estar imerso na natureza. Ao contornar a parte danificada de uma trilha, você contribui para causar um estrago ainda maior no futuro.
- Quando estiver acampando, evite áreas frágeis que levarão um longo tempo para se recuperar após o impacto.
- Acampe somente em locais pré-estabelecidos, quando existirem. Procure avaliar com antecedência se a área visitada permite acampamentos.
- Acampe a pelo menos 60 metros de qualquer fonte de água.
- Não cave valetas ao redor das barracas, escolha com calma o melhor local e use um plástico sob a barraca.
- Bons locais de acampamento são encontrados e não construídos. Nunca corte nem arranque a vegetação, nem remova pedras ao acampar. Ao sair, procure deixar o local o mais próximo possível de como o encontrou.
4 - Traga seu lixo de volta
- Se você puder levar uma embalagem cheia para um ambiente natural, pode trazê-la vazia na volta.
- Ao percorrer uma trilha, ou sair de uma área de acampamento, certifique-se de que elas permaneçam como se ninguém houvesse passado por ali. Remova as evidências de sua passagem. Não deixe rastros!
- Não queime nem enterre o lixo. As embalagens podem não queimar completamente, e animais podem cavar até o lixo e espalhá-lo. Traga todo o lixo produzido de volta com você.
- Utilize as instalações sanitárias que existirem. Caso não existam banheiros na área, cave um buraco com quinze centímetros de profundidade a pelo menos 60 metros de qualquer fonte de água, trilhas ou locais de acampamento, e em local onde não seja necessário remover a vegetação.
5 - Deixe cada coisa em seu lugar
- Não construa qualquer tipo de estrutura, como bancos, mesas, pontes etc. Não quebre ou corte galhos de árvores, mesmo que estejam mortas ou tombadas, pois podem estar servindo de abrigo para aves ou outros animais. Procure deixar tudo como está.
- Resista à tentação de levar "lembranças" para casa. Deixe pedras, artefatos, flores, conchas etc. onde você os encontrou, para que outros também possam apreciá-los.
- Vale a máxima: “tire apenas fotografias, deixe apenas leves pegadas, e leve para sua casa apenas suas memórias.”
6 - Não faça fogueiras
- Fogueiras matam o solo, enfeiam os locais de acampamento e representam a grande parcela dos incêndios florestais.
- Para cozinhar, utilize um fogareiro próprio para acampamento. Os fogareiros modernos são leves e fáceis de usar. Cozinhar com um fogareiro é muito mais rápido e prático que acender uma fogueira.
- Para iluminar o acampamento, utilize um lampião ou uma lanterna em vez de uma fogueira. Uma fogueira ainda impede a perfeita visão de uma bonita noite estrelada.
- Se é absolutamente necessário acender uma fogueira, utilize os locais previamente estabelecidos, e somente se as normas da área permitirem.
- Mantenha o fogo pequeno, utilizando apenas madeira morta encontrada no chão.
- Tenha absoluta certeza de que sua fogueira está completamente apagada antes de abandonar a área.
7 - Respeite os animais e as plantas
- Observe qualquer animal a distância. A proximidade pode ser interpretada como uma ameaça e provocar um ataque, mesmo de pequenos animais. Além disso, animais silvestres podem transmitir doenças graves.
- Nunca alimente animais. Eles podem acabar se acostumando com comida humana e passar a invadir os acampamentos em busca de alimento, danificando barracas, mochilas e outros acampamentos.
- Não retire flores e plantas silvestres. Aprecie sua beleza no local, sem agredir a natureza e dando a mesma oportunidade a outros visitantes e às gerações futuras.
8 - Seja cortês com outros visitantes
- Ande e acampe em silêncio, preservando a tranqüilidade e a sensação de harmonia que a natureza oferece. Deixe rádios e instrumentos sonoros em casa.
- O lugar dos animais domésticos é em casa. Caso traga o seu animal com você, mantenha-o controlado todo o tempo, incluindo evitar latidos ou outros ruídos. As fezes dos animais devem ser tratadas da mesma maneira que as humanas. Elas também estão sob sua responsabilidade. Procure saber com antecedência se a área visitada permite a entrada de animais domésticos.
- Cores fortes, como branco, azul, vermelho ou amarelo, devem ser evitadas, pois podem ser vistas a quilômetros de distância e quebram a harmonia dos ambientes naturais. Use roupas e equipamentos de cores neutras, para evitar a poluição visual em locais muito freqüentados.
- Colabore com a educação de outros visitantes, transmitindo os princípios de mínimo impacto sempre que houver oportunidade.

Fonte: O texto acima foi uma livre adaptação do folheto editado pela Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente - Diretoria do Programa Nacional de Áreas Protegidas, em dezembro de 2000, com a colaboração técnica do Centro Excursionista Universitário e apoio financeiro da embaixada dos Países Baixos. Esse folheto representa a mais recente iniciativa no sentido de sistematizar um conjunto de princípios sobre o mínimo impacto adequado à realidade brasileira. Também representa o engajamento de um órgão oficial na busca de uma mudança de atitude em relação ao uso público de áreas naturais e de unidades de conservação como os Parques Nacionais. As principais referências utilizadas foram o material da Leave no Trace Inc. e o folheto Excursionismo Consciente, organizado pelo geógrafo e montanhista Roney Perez dos Santos e distribuido pelo CEU em 1996.


 

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